O objetivo final do novo governo pode ser a
perseguição de quem discorda de seu regime
Medida Provisória 870 coloca organizações da sociedade civil sob controle – e vigilância – da Secretaria de Governo e contraria a Constituição, que prevê liberdade de associação dos cidadãos. Para a Associação Brasileira de Organizações Não Governamentais (Abong) trata-se de um ataque à democracia. A entidade entrou com ações para reverter o texto da MP.
As organizações da sociedade civil temem que, após a edição de sua primeira medida provisória, o governo de extrema-direita do presidente Jair Bolsonaro (PSL) ataque o direito constitucional à liberdade de associação, representação, organização e atuação dos cidadãos. O artigo 5º da MP 870, em seu inciso II, coloca as Organizações não Governamentais (ONGs) sob supervisão e controle da Secretaria de Governo, o que vai contra o artigo 5º da Constituição.
Em resposta, a Associação Brasileira de Organizações Não Governamentais (Abong) publicou nota pública em repúdio do texto do governo recém-empossado. "Não cabe ao Governo Federal, aos governos estaduais ou municipais supervisionar, coordenar ou mesmo monitorar as ações da organizações da sociedade civil", afirma a entidade.
Um dos diretores-executivos da Abong, Mauri Cruz, alerta que o grande risco representado pela MP de Bolsonaro é o impacto sobre a própria democracia brasileira. "Nossa principal preocupação não é só com a MP, mas com a democracia. Para termos uma democracia plena, precisamos de liberdade, autonomia da iniciativa privada, da sociedade civil e da imprensa. A democracia tem várias bases, como a autonomia dos poderes junto da sociedade civil autônoma para se organizar de forma não tutelada", disse.
Na avaliação de Cruz, o objetivo final do novo governo pode ser a perseguição de quem discorda de seu regime. "É importante que seja corrigida essa inconstitucionalidade, para que ela não seja utilizada para tentar criminalizar organizações das quais, por acaso, o governo discorde de sua atuação e opinião.. Querer usar de um instrumento legal para perseguir alguma organização que venha a ter um embate legítimo nos parece muito preocupante", completa Cruz.
A Abong afirma ainda que a própria viabilidade da medida desperta dúvidas. O controle de todas as organizações parece impossível, já que são milhares delas no país. As próprias ideologias e motivações são extremamente plurais. "Imagine a estrutura que seria necessária construir no governo para fazer esse monitoramento", afirma Cruz, para quem tal tarefa iria contra o discurso de Bolsonaro, que assume prometendo "enxugar" a máquina estatal.
Resistência
As organizações estudam agora formas de impedir as arbitrariedades que a edição da MP sugerem. "Primeiro vamos fazer uma interpelação administrativa para que corrijam este termo. Não nos parece de bom tom deixar um instrumento jurídico em aberto, é necessário que ele seja adequado à Constituição", afirma Cruz, acrescentando que já existem diálogos com órgãos como a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e mesmo com a Conferência dos Bispos do Brasil (CNBB) para o agrupamento de forças e a elaboração das peças jurídicas.
Outra frente de resistência republicana à ameaça de cerceamento da democracia é parlamentar. "Caso o governo não tome a iniciativa (de revogar ele mesmo os pontos em questão), esta MP tem um tempo de vigência limitado, ela precisa passar pelo Congresso. Então, vamos estabelecer uma relação com as bancadas, tanto do governo quanto da oposição, para que haja esta adequação posterior", finaliza.
Como se trata de matéria constitucional, como último recurso ainda caberia apelar ao Supremo Tribunal Federal (STF).
Fonte: Rede Brasil Atual
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