quinta-feira, 21 de fevereiro de 2019

Pobres idosos e pensionistas


Daniel Vazquez, professor da Unifesp, analisa por que a reforma da Previdência do governo Bolsonaro prejudicará especialmente os mais pobres e mal inseridos no mercado de trabalho. "Se o projeto for aprovado, será o fim da Previdência Social no Brasil", diz

Por Daniel Vazquez*

Antes de uma breve análise da proposta de Reforma da Previdência, darei dois exemplos para esclarecer. Não são casos extremos, ao contrário, são situações bastante comuns.

EXEMPLO 1) ESTÁ ENTRE OS 66,5% DOS CASOS QUE RECEBEM 1 SALÁRIO MÍNIMO
* Trabalhador com 65 anos, que começou a trabalhar com carteira assinada aos 18 anos, mas que devido à informalidade e ao desemprego, só conseguiu contribuir 8 meses a cada 2 anos trabalhados, ou seja, passou apenas 40% do tempo em empregos formais, somando 225 contribuições mensais (18,8 anos).
Situação atual = aposentadoria imediata, com benefício de 1 Salário Mínimo (R$ 998)
Após a reforma completa = ele terá que ter mais 15 meses de contribuição (até completar 240 contribuições), o que pode significar quase 3 anos mais, considerando a mesma proporção de formalidade.
* Quando esse trabalhador morrer, a pensão da viúva será:
Situação atual = igual a 1 salário mínimo (R$ 998)
Após a reforma, sem transição = 60% do Salário Mínimo, ou seja, R$ 598,80. Isso mesmo, menos que o Mínimo!
EXEMPLO 2) CORRESPONDE AO BENEFÍCIO SUPERIOR A 2 SALÁRIOS MÍNIMOS (SOMENTE 17% DOS CASOS RECEBEM VALOR IGUAL OU MAIOR)
* Trabalhador com 60 anos, que começou a trabalhar aos 20 anos, só ficou 10% do tempo desempregado ou informal, com um salário médio de contribuição de R$ 2.500, somando 36 anos de contribuição.
Situação atual = aposentadoria imediata com valor de R$ 2.500 (regra 86/96)
Após a reforma completa = terá que trabalhar mais 5 anos e se aposentará com praticamente o mesmo valor.
* Quando esse trabalhador morrer, a pensão da viúva será:
Situação atual = R$ 2.500
Após a reforma, sem transição = 60% do benefício, ou seja, R$ 1.500
Bolsonaro disse que “a nova Previdência será justa e para todos, sem privilégios”. Você acha que será ela é justa? Você acha que os casos acima correspondem a “privilégios” cortados?
A reforma da Previdência só visa reduzir benefícios, sem propor fontes alternativas de financiamento ou como melhorar a inserção das pessoas na seguridade, diante da alta informalidade e do elevado desemprego. É importante acompanhar os debates, ver as posições de quem é a favor ou contra a Previdência, há alternativas políticas e econômicas que merecem ser discutidas.
A idade mínima chama atenção no debate, mas há problemas bastante graves que passam mais desapercebidos da opinião pública, como o caso das pensões e do Benefício de Prestação Continuada (BPC) que poderão ser inferiores ao Salário Mínimo. Aumentar o tempo de contribuição para 20 anos (25% a mais que hoje) excluirá muitas pessoas da aposentadoria no futuro, já que o nível de informalidade atingiu recorde de 43% em 2018, ou seja, 39,7 milhões de trabalhadores sem contribuição e cobertura previdenciárias (Pnad, IBGE).
A conclusão é que a reforma da Previdência de Bolsonaro prejudica especialmente os mais pobres e mal inseridos no mercado de trabalho que, se chegarem aos 65 anos, boa parte não conseguirá contribuir por 20 anos. Considerando a dinâmica do mercado de trabalho brasileiro, as mulheres serão ainda mais prejudicadas. Serão grandes vítimas dessa reforma as pessoas que dependerão de pensão e do Benefício de Prestação Continuada (BPC) e que terão que sobreviver com menos que o salário mínimo.
Se esse projeto for aprovado, será o fim da Previdência SOCIAL no Brasil!
*Daniel Vazquez é doutor em Desenvolvimento Econômico. Professor da Unifesp.
Fonte: Revista Fórum

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